quarta-feira, 16 de abril de 2008

Mikhail Baryshnikov: transparencia e simplicidade.

Meu amigo Antonio, também ex-bailarino, disse uma vez numa roda de amigos aqui em Viena, na qual falávamos sobre Nureyev: “ Eu sei, voces todos pensam em Nureyev como o supra-sumo do ballet... para nós (ele incluiu-me neste “nós”) existem vários outros bailarinos mas só uma estrela do ballet: Mikhail Baryshnikov”. E ele tem razao absoluta. Nós somos da geracao que ficou boquiaberta quando viu pela primeira vez o fenomeno Baryshnikov.
(Eu, particularmente, nao “venero” a memória de Nureyev também por um outro motivo: um homem que sabia que estava com AIDS e que continuou à infectar outras pessoas – de acordo com uma biografia, calcula-se que mais ou menos 1500 pessoas devem sua contaminacao à ele – nao merece para mim este “pedestal” que as vezes ainda é feito para ele. O que aconteceu aos nossos valores morais?).
Baryshnikov nos mostrou que dancar era outra coisa e elevou o standard do ballet no mundo ocidental da noite para o dia... De um dia para outro nossas “metas” se triplicaram em tamanho. Ele nos abriu novos horizontes. Ele nos mostrou uma nova técnica... Uma vez alguém fez um comentário sobre o tenista Björn Borg, que na minha opinao aplica-se maravilhosamente à Baryshnikov: “Nós jogamos tenis, ele joga outra coisa!!!! ”.

Além de tudo (musicalidade, técnica refinadíssima, humor, inventividade – qualidades que Rudolf Nureyev na realidade nunca possuiu) Baryshnikov é um homem inteligente, culto. Um professor meu uma vez disse: “Para se dancar voce tem que saber o que é uma equacao, uma raiz quadrada... “. Um homem equilibrado ele nunca transformou-se em “estrelíssimo” (e nunca parou uma orquestra para corrigir erroneamente o maestro, como Nureyev fez no Brasil... um “faux-pas” até hoje lembrado pelos que assistiram aquele espetáculo. Por sinal, o maestro era Karabitchewsky) .
Misha, nasceu em 1948, e aos 26 anos, depois de ter alcancado fama (também no ocidente devido à tournées etc.) com o Balet Kirov, fugiu em 1974 durante uma tournée no Canadá. À partir deste momento ele tornou-se o maior astro do American Ballet Theatre... Sua partner principal nesta época foi Gelsey Kirkland (Vide minha postagem: A volta da (um pouco mais) velha senhora). Ele “chocou” o mundo da danca em 1978 ao abandonar o ABT e se mudar para o New York City Ballet para ir trabalhar com “Mr.B.” (George Balanchine) que nunca aceitou trabalhar com “guests” (por isto ele nunca trabalhou nem com Natalia Makarova nem Nureyev entre outros). Misha nao tinha realmente as “linhas” necessárias que eram/sao exigidas para os ballets de Balanchine. Mesmo assim “domou” o seu corpo para poder encarar ballets como “Apollo”, “Prodigal Son”, “Rubies” etc. Um processo similar, porém inverso, ou seja, do NYC Ballet para o ABT, tinha acontecido vários anos antes com Gelsey Kirkland – vide minha postagem acima mencionada!
“Mr. B.” nunca fez um ballet para Baryshnikov. Sómente Jerome Robbins (à quem Bea Arthur nao tece nenhum elogio – muito pelo contrário... ) criou “Opus 19: The dreamer” para ele e para a linda Patricia McBride... um ballet realmente nao muito lembrado.

À partir de 1980 ele voltou ao ABT mas também como diretor.
Eu, além de te-lo visto algumas vezes dancando no Rio, em Viena e em N.Y. também tive o prazer de ve-lo numa maravilhosa producao de “Metamorfose” de Kafka na Broadway. Outros trabalhos como ator incluém nao só os filmes “The turning point”, “Dancers” e “White nights” como também uma producao de quatro pecas curtas de Samuel Beckett em 2007 sob direcao da avantgardista JoAnne Akalaitis. Na televisao trabalhou em “Sex and the city” e os amantes do ballet estao até hoje frustrados e nao podem compreender porque Carrie deixou-o por “Mister Big”...

Aqui um dos seus “statements” do qual gosto muito (talvez pela simplicidade deste) :
"It doesn't matter how high you lift your leg. The technique is about transparency, simplicity and making an earnest attempt”.

Nenhum comentário: