É muito difícil ter-se uma exata imagem de quem foi Josephine Baker, da pessoa atrás da máscara que usou toda a vida. Todas suas biografias são contraditórias... Difícil entender os seus motivos, os seus porques, aqueles que não tinham o que ver com o preconceito contra sua cor de pele – este motivo, sim, era mais do que óbvio: pura sobrevivencia e desejo de ser respeitada…
Josephine criou um furor em Paris quando dançou práticamente nua na «La Revue Nègre» de Paul Colin em 1925.
Mas esta forma de sucesso imediato era baseado no puro «escandalo» de estar com os peitos nús no palco… Seguiram outros “pequenos” escandalos (mínimas tangas de bananas por exemplo) mas quando estes passaram a ser parte do dia-a-dia parisiense e perderam seu inicial “impacto”, ela teve que fazer um tournée pela Europa para poder manter-se pagando as contas: na Suécia virou um ídolo, em Viena chamaram-a de «bruxa» e os cartazes, nas demonstrações na frente do teatro onde se apresentava, mandavam-a de “volta para a África”.
De volta a Paris percebeu que não era suficiente ser uma dançarina escandalosa e exótica que pintava as unhas de dourado e passeava seu leopardo na coleira (trocada todo dia para estar de acordo com sua roupa) pelos Champs Elysées… Não.
Os “Anées folles” chegavam ao fim…
Aprendeu a cantar, tomou aulas sérias de dança, foi ensinada a se vestir, falar, se comportar e criou assim uma nova imagem que nada tinha o que ver com a primitiva, nua, selvagem "africana" (que na realidade degradava extremamente o status de sua propria raça!).
Voltou aos U.S.A. pela primeira vez em 10 anos, para trabalhar num Show do «Ziegfeld Follies» em 1935.
Foi literalmente estraçalhada pela crítica (e público) que não aceitava que ela estivesse fazendo coisas “de branco” (talvez até melhor do que muitos) como cantar textos maravilhosos de Cole Porter e ser o centro do show - bem vestida, bem arrumada, penteada, reluzindo limpeza, glamour e perfume. Isto nos U.S.A. não era coisa de "Negrinha", como foi até chamada no jornal...
Exatamente o que aconteceu com Lena Horne no cinema… uma cena sua tomando banho de espuma foi considerada “risqué” – não era coisa para uma “negra”. E isto, toda esta ignorancia e preconceito “só” há 70 anos atrás…
Que puro absurdo!
(Josephine recebeu propostas de Hollywood… porém para fazer papéis de empregada. Logo ela que era casada com um Conde e tinha seus próprios serventes… ).
Nesta época, apesar de, mesmo com muita crítica negativa, ser uma estrela da Broadway, era obrigada a entrar no seu hotel pela cozinha pois “alguns Gentlemen do Sul que estavam no hotel não estariam de acordo, se incomodariam com sua presença no Lobby, no Restaurante do Hotel”. Seu marido, o Conde, óbviamente podia circular pelo Hotel como bem quisesse.
Acabou seu casamento com ele e voltou arrasada e deprimida à Paris onde era tratada como ser humano de primeira classe (Contava Josephine que ao chegar pela primeira vez em Franca e ser servida por um garçon branco que chamou-a de “Madame”, ela soube imediatamente que esta seria sua futura pátria). Virou cidadã francesa.
O exército alemão invadiu Paris.
Servindo sua nova e amada pátria espionou alemães (ao ser “descoberta” teve que pular de uma janela para se salvar: um envenenamento quase lhe custou a vida e lhe causou a perda dos cabelos), foi enviada pela “Resistance” para a África e trabalhou muito para os aliados.
Continuou sua carreira depois da guerra, voltou à América para uma tournée desastrosa, foi rejeitada em 63 hotéis em N.Y., o espetáclo acabou sendo cancelado depois dela ter processado o Stork’s Club de N.Y. por racismo (ela e seu grupo não foram servidos sob a alegação de que não havia mais comida - Outros que chegaram mais tarde foram servidos!). Tudo isto causou uma campanha negativa, contra Baker que mais uma vez retornou à Paris deprimida e arrasada. Nunca mais voltaria ao seu país de nascimento.
Então adotou várias crianças de várias nações, recebendo assim muita publicidade, acabou seu segundo casamento, perdeu todo seu dinheiro, foi despejada, recebeu um convite de Grace Kelly para viver no Monaco, voltou ao palco num show de notável mau-gosto que foi notávelmente financiado pelo Princípe Rainier, sua esposa Grace Kelly e Jacquie Kennedy Onassis!!!!
Na estréia estavam na platéia Sophia Loren, Mick Jagger, Shirley Bassey, Diana Ross e Liza Minnelli.
Quatro dias após a premiére ela sofreu uma hemorragia cerebral e entrou em coma para falecer pouco depois.
Foi a única “americana” (de nascimento) a receber as honras de um ceremonial de enterro de estado – seu corpo se encontra hoje no cemitério do Monaco!
Mas porque escrevo tudo isso?
A “persona” no palco que Josephine representava nunca me agradou. Muito pelo contrário! Não dou menor valor à provocação do exibicionismo barato (e talvez gratuito?) de suas épocas da “La Revue Nègre” e das tangas de bananas, sua voz era mínima e comum, sua dança sempre foi envolta numa capa de óbvio amadorismo, sua evolução para “Rainha” do Follies Bérgere (ou de seu estilo) é para mim um dos piores casos de mau gosto da história do show-Business, aquela coisa , tão passada, chamada “Plumas e paetês”. Terrível… como se ela de ano em ano se transformasse numa feia caricatura de si mesma.
E isto sem nem mencionar a cafonice de suas últimas apresentações na qual parecia uma espécie de Elvis Presley travestido ou uma mutação amassada de Liberace…
Em 1991 uma biografia de TV de Baker chamada "The Josephine Baker Story" (que nem é mencionada na Wikipedia) foi feita para a televisão: um filme com muitos erros biográficos, muita “água com açúcar” e muita “criatividade” no que diz respeito à vida de Baker.
Josephine na realidade nunca venceu grandes batalhas no que dizia relação ao ativismo contra o problema racial americano. Perdeu a maioria delas e se refugiou numa posição confortável num país onde era muito amada, por ser um ícone.
Nesta cena, que veremos, Lynn Whitfeld (que interpreta Baker) está no Norte da Africa durante a guerra, recuperou-se duma pneumonia e várias outras infecções e decidiu cantar para os soldados, entreter as tropas…
Ela porém para de cantar quando nota que os soldados negros estão “lá atrás” e os brancos sentados nos bancos da frente… Ao som de «J´ai deux Amours» ela transforma esta simples (e linda) chanson num conto de fadas de ativismo de direitos civis (os dois países «dentro dela» não são mais os U.S.A. e a França e sim o seu lado negro e seu lado branco… Note-se que esta música foi composta nos "Anées folles”, nos quais Paris havia-se tornado capital mundial do Jazz, nos quais músicos negros eram « amados » e nos quais problems raciais aind não existiam como hoje ! ).
Bem, final feliz, todos felizes…
os soldados negros vem sentar-se na frente ao lado dos brancos que os recebem com toda a amabilidade e carinho que só existe entre irmãos… como acontece todos os dias (!?!), principalmente nos U.S.A.... esta forma aberta, simpática, aconchegante de ser em relação à cor de pele, tão típica do povo norte-americano... stou sendo cínico? Perdão, mas só a TV americana pode criar cena de tal banalidade e irrealismo!
Pelo menos tudo isso acontece ao som da linda canção e de um (sincronizado) desempenho vocal simplesmente maravilhoso… Uma das razões porque prefiro a sincronizada Lynn (muito linda)ao “original” Josephine com sua "vozinha"…
No final de tudo, pela música, quase vale a pena assistir esta cena lacrimogenia…
Mas temos admitir “entre nous”: se a vida fosse realmente assim…
2 comentários:
ok, você não vai postar esse comentário. Facil ver que não gosta de ser contestado. Baker realmente começa a carreira com uma voz muito ruim, mas depois de se preparar, virou uma cantora excelente. Baker era um sucesso absoluto. O senhor é???????
Prezado Marcelo,
nao sei a que comentário voce se refere. Este parece ser o primeiro comentário seu que entra aqui.
As Tertúlias estao abertas para todos deixarem seus comentários, para gerar uma "conversa" - mesmo que nao concordem com minha opiniao.
Por favor, se voce enviou um comentário anteriormente, reenvie, pois ele nao chegou à minha "inbox".
Nao, eu nao sou um "sucesso". Também nunca pretendi ser! Sou só uma Pessoa que tem muitos Interesses e que respeita doda e qualquer opiniao.
Um abraco daqui de Viena.
Ricardo Leitner
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