domingo, 23 de outubro de 2011

Ragtime: um perfeito retrato do preconceito, do medo e da ignorancia encenado a alto nível....

Quem tem um Blog normalmente compartilha com seus seguidores e amigos aquilo que gosta (ou não), suas coisas preferidas (ou não), suas idéias, suas críticas, suas novidades, suas férias, seu "diário" e, as vezes, também seus princípios… Como tenho, nos últimos tempos, compartilhado muito o que gosto, gostaria hoje de dividir com voces um princípio… um pensamento...


Quando escrevi as palavras preconceito, medo, ignorancia estava consciente do seu efeito, do seu significado… principalmente ignorancia.
Para que voces compreendam bem o meu “pointe” hoje, é extremamente necessário explicar como “vejo e sinto” esta palavra…

Temos a tendencia no nosso portugues de transformar o sentido original de muitas palavras… Exemplos? “Decadencia”, "Barato", “Polaco” (odeio essa palavra) só para citar alguns…

Quando no Brasil falamos de um “ignorante”, temos a tendencia de pensar logo num pobrezinho sem sapatos do interior, num pobre favelado ou num pobre que vem dos subúrbios todo dia para trabalhar na casa de alguém na Zona Sul… Generalizamos e colocamos uma imagem – para nós conhecida – dentro de nossas cabeças. Pois esta é a que conhecemos. Pensamos sómente em pessoas pertencentes à uma certa classe social, e elas são, para nós, pessoas sem instrução…

Quando eu me refiro à palavra “ignorancia” penso em sua origem… “ignorar” no “Aurélio”: “não ter conhecimento, desconhecer” e “ignorante”: “Diz-se de pessoa que ignora, que não tem conhecimento de determinada coisa”.

Há nisso uma diferença sutil porém essencial...

Tudo o que se refere à “instrução” aparece bem depois e não faz parte da “base” essencial desta palavra. Por isto para mim pessoas “nada humildes” poder ser consideradas „ignorantes“. E é este o sentido com o qual a palavra “Ignorancia” é usada no alemão. Não é só ignorante aquele que não sabe qual é capital do Holanda mas também aquele que ignora completamente seres humanos, despreza outras culturas… e , as vezes, nem está consciente disso!


Pensemos no musical “Ragtime”: baseado na famosíssima Novela de 1975 de Terrence McNally (alguém leu esse livro? Uma maravilha) ele conta a estória de tres grupos étnicos nos U.S.A. Uma única cena desta maravilhosa obra (que na época não foi um sucesso comercial) descreve perfeitamente a ignorancia à qual venho aqui me referindo. Nos tres grupos ! Este “desconhecer” outras culturas, formas de ser, idiomas, cores de pele, religiões, hábitos… Um processo não só muito conhecido nas nossas Américas mas muito, muito tendencioso aqui na Europa… Infelizmente!


Quando vejo o grupo dos “americanos” com suas roupas brancas, penso em “Meet me in St.Louis”, filme da MGM e de Minelli que também nos vendeu esta imagem “branca” da America, já que neste St.Louis não aparece durante toda a extensão do filme uma única pessoa representante de um outro grupo étnico… Já repararam como isso é incrívelmente comum em filmes da velha MGM?
Ignorancias da America e de Mr. Louis B. Mayer! Ignoravam simplesmente... e completamente!


Uma lembrança: lembro quando dei de presente este DVD a um conhecido meu na Alemanha. Ele disse: “Quase dormi, que chatura e tirei no meio…”. Ou seja ele ignorou uma coisa que muito lhe queria mostrar. Ignorou. Mas aí está a “seiva” do que quero dizer… A real ignorancia. E tanto ele ignora o que outros pensam, fazem profissionalmente e sentem que seu trabalho tem-se transformado numa sucessão de fracassos embaraçosos (mesmo que na província, onde o nível teatral é bem mais baixo). Ignorar é não aprender e não se desenvolver…

Assistam tranquilamente esta excepcional cena, que vocalmente chega ao limite do “musical”…
O coro é de um precisão tão perfeita, de uma qualidade tão maravilhosa que quase alcança o "território" que pertence à Ópera nas últimas barras.
Aliás, o “Coro” não. Os tres Coros…


Para quem curte e conhece a Broadway e seus "performers", é muito interessante ver-se a talentosíssima Audra McDonald (de vestido vermelho), começando sua carreira, nesse espetáculo!


Uma ex-bailarina e ex-conhecida minha disse um dia: “O pior ignorante é aquele que se acha sábio“. E ela, com sua conhecida precisão no expressar-se disse tudo! Falou uma grande verdade!

Eu gostaria porém de adicionar um outro pensamento à minha forma de “ver” e”entender” o sentido da palavra ignorancia: “Um ignorante generaliza” (refiro-me à idéias pré-concebidas sobre raças, nacionalidades, religiões!).
É triste!

Ragtime, “denuncia” preconceitos, medos e, acima de tudo, a ignorancia!
Viva Ragtime, impossível de ser ignorado!
Grande trabalho – e no nosso mundo atual, de suma importancia!

Era isso o que quiz compartilhar hoje com voces…

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