Viena, 18.6.2011
Ontem acordei com o que chamo de “My Leontyne Price-Mood”. Entre meus vários CDs busquei um (capa abaixo) com «A» gravação de «Chi il bel Sogno de Doretta» de «La Rondine» (Puccini). Uma de suas interpretações que mais prezo, mais admiro… E fiquei pensando, refletindo sobre a carreira desta excepcional artista…
Que longo caminho percorreu esta menina de Laurel, Mississipi…
Filha de uma parteira e de um marcineiro que a encheram de amor (esperaram 13 anos pela “chegada” dessa criança em 1927), já na tenra infancia Leontyne demonstrou seu talento em relação à música. Com tres anos de idade seus pais lhe deram um piano de brinquedo – para logo colocá-la em aulas sérias com uma professora local. O “gramofone”da família foi vendido para interar o “sinal” de um piano verdadeiro para a menina Leontyne. A patroa de uma tia sua (que era lavadeira), Mrs. Chisholm, figura de influencia local, incentivou não só seus estudos de piano como também sua extraordinária voz.
O resto é história.
Com a ajuda financeira dos Chisholm e do baixo Paul Robeson (que deu um concerto beneficente para ela) ela pode aceitar uma bolsa de estudos na Julliard – pois seu “alvo” era tornar-se uma professora…
Uma revival de “Porgy and Bess” de Gershwin em 1953 mudaria sua vida. Neste mesmo ano o “Met” convidou-a para cantar com o Ensemble no Ritz Theater da Broadway para uma Gala de fins caritativos. Ela foi então a primeira afro-americana a cantar “com” o Met (apesar de não ter sido a primeira a cantar “no” Met).
Mais anos de muito estudo, definição de repertório, aprendizado em recitais, tournées pelos U.S.A., India e Australia seguiram… Até que em setembro de 1957 ela debutou no palco da Ópera (“Dialogues de Carmélites” de Poulenc). Antes ela já tinha sido convidada por Herbert von Karajan para debutar no Scala (sob sua regencia) em “Salomé”, ela porém declinou. Não sei realmente porque…
Em 1958 mais uma vez von Karajan convidou-a para «Aida» na Staatsoper em Viena – palco que seria muito importante para todo o resto de sua carreira, palco no qual foi declarada “Prima Donna assoluta”. Leontyne Price virou a cabeça do público vienense, revolucionou o mundo da Ópera aqui e tornou-se o ídolo dos estudantes que a carregavam desde a entrada dos artistas da Staatsoper até o Hotel Sacher, onde se hospedava.
No ano seguinte ela retornaria à Viena não só para repetir seu sucesso como “Aida” mas também para debutar como Pamina em “A flauta mágica” de Mozart. Sua pura voz e um “entendimento” mais do que simplesmente “gramático” do idioma alemão deram-lhe a facilidade de entender a delicadeza e projetar a leveza de um Mozart, assim como anos mais tarde abririam-lhe as portas para a complexidade das perfeitas, poéticas frases musicais de um Richard Strauss…
Depois de Viena seguiram-se “debuts” no Covent Garden, Arena di Verona e no “La Scala”.
Rudolf Bing, o temido diretor do Met, convidou-a para uma única performance de “Aida” no Met em 1958. Ela não aceitou, como lhe foi recomendado pelo seu “manager”: “Leontyne Price está destinada a ser uma grande artista. Quando ela debutar no Met, será como uma grande Dama, não como uma escrava”, disse ele.
Um ano mais tarde Bing a ouviu uma vez mais em Verona em “Il Trovatore” e a convidou para o Met – desta vez para vários papéis. Ela aceitou.
Ela debutou junto a Corelli em “Trovatore” (num, por ssim dizer “debut duplo”) e o público a ovacionou por 42 minutos! Um “record” até hoje na história dessa casa.
Entre os vários papéis que lhe foram oferecidos figurava também Cio-Cio-San de “Butterfly” que ao contrário da “lenda” foi interpretada SEM maquiagem branca .
Sua última “Ópera” foi “Aida” em 3 de janeiro de 1985. Uma carreira de 32 anos que ainda continuou em concertos e recitais em Hamburgo, Viena, Paris, Lucerna e no Festival de Salzburgo por mais 12 anos. Seu poder vocal foi fenomenal. Ela sempre alcançou os “High Cs” com muita facilidade – ela mesmo disse que, debaixo do chuveiro, alcançava regularmente também um “High F”. Fenomenal.
Inspiração de grandes artistas como Kiri Te Kanawa, admirada por «colegas de profissão» como Pavarotti (“Só poucas cantoras conseguem encher um “Hall” para um concerto ou um recital: Joan Sutherland, Leontyne Price e Marilyn Horne”), Placido Domingo (“O mais lindo Soprano de Verdi que até hoje ouvi”) e até Callas (“Eu ouço muito amor em sua voz”).
Leontyne recebeu muitas homenagens em sua bela carreira – a última em 2008 “Honoree at National Endowment for the Arts Opera Honors”.
Ela vive em Greenwich Village.
Gostaria de deixar aqui dois momentos, bem diferentes, de sua fase concertante. A ária de «La Rondine» ao qual me referi quando comecei a escrever esta postagem… o que ouvi ontem…
Que momento supremo!!!!
…e, já celebrando o (nosso) verão que entrará dia 21... “Summertime” de Gershwin. "Carro-chefe" que ela nunca esqueceu apesar de que técnicamente não se compara ao canto lírico que a tornou famosa em todo o mundo. Eu adoro...
Eterna Leontyne Price!!!
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