domingo, 9 de novembro de 2014
Nunca é realmente tarde para se realizar um sonho (ou "Le Spectre de la rose")
Lillian Gish ( 1893 – 1993), lenda do cinema e teatro americano a quem eu já deveria ter dedicado 20 “tertúlias”, trabalhou de 1912 a 1987 sendo uma das poucas pioneiras do Cinema mudo que fez uma real carreira no cinema sonoro…
Spectre de la Rose foi assitido pela primeira vez nos U.S.A. (e também por Lillian Gish) em 1916, bailado por Vaslav Nijinsky e Tamara Karsavina… o primeiro Ballet a ser dançado no “Met”. Trabalho que juntou, além dos grandes bailarinos, os talentos do compositor Weber, de Leon Bakst nos cenários e figurinos, do coreógrafo Michel Fokine…
(acima filme "fake" feito de fotos de Nijinsky e Karsavina, bonito trabalho mas não verdadeiro - infelizmente não existe nenhum material filmado de Nijinsky)
Patrick Dupond, que no filme “She dances alone” foi Nijinsky ao lado de Kyra Nijinsky (na vida real filha de Vaslav), teve uma grande época na Ópera de Paris e no Ballet internacional nos anos 70 e 80… Eu tive a grande felicidade de assistí-lo com "Les Etoíles" da Ópera de Paris ainda no Rio...
Mas o que uma coisa tem que ver com a outra? Temos que viajar à Metropolitan Opera House, N.Y. (ou o „Met“ como é chamado íntimamente por seus fãs e frequentadores) que abriu suas portas em 22 de Outubro 1883 na Broadway entre a 39th e a 40th Street… (O prédio atual, no Lincoln Center, só foi inaugurado em 1966!).
Aos 100 anos de sua abertura foi organizado no Met um espetáculo que reuniu um “Who’s who” da Ópera Internacional: nomes, na época, atuais como Domingo, Sutherland, Pavarotti, Ludwig mas também nomes que já não mais estavam ativos nos palcos, como a húngara Martha Eggerth, como a brasileira (e no Brasil ignorada) Bidú Saião…
Mas nesta “Gala” uma atriz “roubou” o espetáculo… e realizou um sonho de toda uma vida… Lillian Gish. Para o “Spectre de la Rose” de Patrick Dupond, ela foi “A debutante” que adormece numa cadeira depois do seu primeiro baile... Ela, que era só 10 anos mais jovem que o Met, estava aqui com 9o anos. Linda no palco, elegante, classuda, digna, sendo amada, aplaudida e respeitada por não sei quantas gerações de fãs.
Lillian, a lenda que ainda viveria quase 10 anos e que faleceria só em 1993 – pouco tempo antes de cumprir o seu centésimo aniversário. Mulher culta, bela na sua idade, em qualquer idade e cheia de dignidade – sem aquelas deformações que as plásticas, silicones e botoxes “da vida” fizeram em tantas outras que hoje em dia andam por aí com 90 anos parecendo bruxas… não, parecendo não, como perfeitas bruxas… Não deveriam deixar pessoas assim sair à rua : assustam as crianças… :-)
Como ela mesmo diz na introdução do vídeo, depois de ter assistido Les Ballets Russes e Nijinsky, este virou o seu grande sonho… fez aulas de dança com Ruth St.Dennis mas nem o tempo, nem sua carreira no Cinema (e depois no Teatro) e nem já sua idade na época lhe permitiram fazer este “dream come true” . Para esta curta aparição ela foi ensaiada nor ninguém menos que Natalia Makarova, que aprendeu este papel diretamente de sua criadora, Karsavina. Que Début para Lillian Gish aos 90 anos!
Ela realmente esperou muito mas quando finalmente estreiou, a produção foi perfeita! (Abaixo Karsavina ensaiando o papel da Debutante com Fonteyn).
Como me deixou feliz assistir este video. E, principalmente, este outro “enfoque”, esta outra leitura do ballet que automáticamente “aconteceu” na minha cabeça: porque uma Senhora de 90 anos não pode estar a sonhar (ou a relembrar?) com o amor, com o Espectro da Rosa? Coisa linda. Plena.
Ao assistir e reassistir, fiquei com saudades dela e daquele rostinho para sempre “moço” que assisti pela última vez em “The Whales of August”, filme magnífico e humano, ao lado de Bette Davis (1987).
Como esta homenagem me emocionou...
Amei mais uma vez , e de outra forma, este Ballet que vem da magnífica tradição e época única na história dos “Les Ballets Russes” e de Fokine, Bakst, Nijinsky, Diaghilev, Karsavina…. Nao é mera coincidência que tantos talentos se reunam assim, numa época, num devido lugar… coincidências assim definitivamente não existem!
Minha alma se encheu de melancolia ao ver um jovem Patrick Dupond antes do terrível desastre que em 2000, aos 40 anos (somos da mesma idade) deixou-o impossibiltado de recuperar-se físicamente para o Ballet e prosseguir com sua brilhante carreira.
Sobre Gish só me resta dizer, melhor, repetir uma expressão inglesa que acho muito adequada, apropriada à ela:
“There are people who get old and people that age” (Existem pessoas que ficam velhas e pessoas que ficam com idade).
Sim... pessoas que ficam velhas e outras que ficam com idade! Voces "vem" ao que me refiro?
Esta é a real essencia desta Tertúlia… este “querer realizar um sonho”, mesmo que com idade, é o que faz a diferença. Toda a diferença. É o que nos mantém vivos, jovens… Só quando deixamos de sonhar é que nos tornamos velhos... E este é também o tema central de “The Whales of August”, filme que profundamente recomendo.
Dedicando esta tertúlia à todas as dignas Senhoras de idade, digo só:
Obrigado Lillian por esta sábia licão de vida: Nunca é realmente tarde para se realizar um Sonho…
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