segunda-feira, 27 de abril de 2009

The forgotten IV: A foreign Affair (1948)


Um destes filmes, que apesar de serem “imperdíveis”, foram práticamente esquecidos. Quando se fala na carreira do austríaco Billy Wilder em Hollywood, práticamente não são mencionados seus filmes anteriores a “Sunset Blvd.” (O título original tem “Boulevard” de forma abreviada. No Brasil chamou-se "Crepúsculo dos Deuses", apesar de nao ter nada em comum com a ópera de Wagner!), apesar de ter dirigido obras-primas anteriormente como “The major and the Minor” (1942), “Double Idemnity” (1944) e “The lost Week-End” (1945). “A foreign Affair” é uma destas obras “esquecidas”... Junto com “One, Two, Three” este filme constitue a filmografia “berlinense” de Wilder. Dois dos melhores filmes já feitos sobre Berlin – junto a “Cabaret” de Bob Fosse.

A estória, o “plot” do filme é na realidade bem simples: Um comitê de designados do congresso americano voa, depois da guerra, para Berlin. Entre estes designados encontra-se uma mulher, bem conservadora e chata, chamada Phoebe Frost (Jean Arthur) de Iowa. Ela quer “checar” a moral dos GIs, das tropas. Quando por uma casualidade ela vai a um Nightclub chamado “Lorelei”, assiste quase em estado de choque à cantora Erika von Schlütow (Marlene Dietrich) cantando “Black Market” e vendendo por qualquer preço sua moral, suas convicções... ( ♫ ♪ “For you for your K-ration, compassion and maybe an inkling, a twinkling of real simpathy, I’m selling out, Take all I’ve got: Ambitions, Convictions, the Works... Why not? Enjoy these goods, for boy these goods, are hot!” ♪ ♫).
Um texto bem próximo das atividades dos “Black Markets” da época...

Aliás, neste texto há uma peculiaridade. Referindo-se à primeira edicao de um livro, ela canta: "A simple definition; you take art, I take Spam". Voces sabem ao que ela se refere como Spam? à uma espécia de carne enlatada que os americanos distribuíam pela Europa para todos os famintos aqui, que comiam qualquer coisa. Dizem que era como comida de cachorro ou até pior pois cheirava malíssimo... esta é a razao dos "Spams" que se recebe hoje em dia por e.mail serem chamados assim... lixo!

Erika é a “ex-mulher” de um grande nazista que ainda é procurado... e, descobre-se, que ela é a “ protegida” de “grande peixe” do exército americano – apesar de ter tido um “passado” nazista e ter pertencido oficialmente a este partido (durante o decorrer do filme são descobertos filmes que mostram Erika ao lado de Hitler, flertando com ele, durante uma apresentação de Lohengrin). Quem “protege” Erika? O capitão John Pringle. E foi exatamente para ele que Phoebe trouxe uma torta que sua namorada fez (em Iowa). Não preciso dizer que Phoebe se apaixonará por John, criando o conflito central do filme (Erika não quer abdicar de tudo que Capitao Pringle traz para ela: café, cigarros, chocolates, meias de sêda, pasta de dente... artigos de “luxo” nos anos depois da guerra).

A razão desta postagem é porém outra: a extrema inteligência de Billy Wilder.
Numa época em que ainda existia uma certa animosidade contra os americanos, um certo “rancor” depois das guerra (temos que pensar no povo... sim naqueles que tiveram suas casas, lares e cidades completamente bombardeados!), Billy conseguiu fazer uma obra-prima que agradou a “Gregos e Troianos”. Sim. Nunca vi uma dualidade funcionar tão bem no cinema! Quanto cinismo – muito bem usado por sinal!

Pensemos, por exemplo, na cena de abertura do filme: um pequeno avião, que leva o dito comitê do congresso, para Berlin, “sobrevoa” a cidade. Imagens (reais) de uma Berlin completamente bombardeada e acabada são impressionantes. De valor até documental.


O diálogo se desenvolve e ouvimos como os designados encaram sua “missão” na Alemanha: eles vão a Berlin para levar um pouco de “cultura” e “civilização” a estes “Bárbaros” (isto vendo-se ao fundo uma Berlin arrasada, aniquilada). O público europeu morreu de rir desta ironia – pois entendeu a crítica de Wilder sobre os americanos (uma nação “jovem” vai levar “civilização” à pátria de Goethe? de Schumann?). Já o público americano ficou orgulhosíssimo deste enfoque e levou-o completamente a sério. Como seria de esperar. Dos dois lados do oceano este filme e sua linguagem fizeram sucesso – e este é só um pequeno detalhe. Na realidade Billy Wilder conseguiu escrever dois filmes ao mesmo tempo, com um único roteiro. Dependendo de que lado do oceano voce estivesse, voce o entenderia diferentemente.

Mas talvez tenha sido esta a razão do “esquecimento” deste filme... Nao sei se os americanos prezam a imagem que é feita deles neste filme...

Nos U.S.A. durante a cena na qual Phoebe canta para a tropas o hino de “Iowa” (que foi o último estado a entrar na “União”) o público vibrou, como vibra com as Cheer-Leaders dos jogos de Baseball... O Europeu morreu mais uma vez de rir pois a cena beira o ridículo e o patético (para a mentalidade européia).

Quando Erika diz a Phoebe que está muito decepcionada com o “Look” da mulher americana (para insultá-la), a designada do congresso assume um papel de vítima para o público americano. As vítimas porém para o Europeu foram as “Erikas da vida” (as sem passado nazista, diga-se de passagem) que perderam seus maridos e famílias. As que foram bombardeadas para fora de suas casas e cidades (como Erika mesmo diz ao decorrer do filme: “Do you know what it meant to be a woman in this city when the russians came?” ou “We cannot afford to be generous, we’re very poor!”). Como se ve, tudo uma questão de enfoque... de ponto de vista. Mas agradar a Gregos e Troianos... só Billy Wilder, principalmente nesta temática difícil que ainda estava tao recente, tao “à flor da pele” em 1948... que inteligente Billy era...


Ele teve problemas durante as filmagens com suas atrizes. Ele comentou ironicamente sobre as dificuldades que teve com Jean Arthur e Marlene: “ I have one dame who’s afraid to look at herself in a mirror and another who won’t stop looking!”.

As canções “(Want to buy Some) Illusions?”, “Black Market” (Magnífica!) e “Amidst the ruins of Berlin” foram compostas por Friedrich Hollaender (que tinha composto a música de “The Blue Angel” – “Der Blaue Engel” eternizadas em 1930 por Marlene). Junto a Dietrich, que por sinal está muito bem neste filme – é ele mesmo ao piano, acompanhando-a com o seu inimitável “som”.
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