quarta-feira, 12 de maio de 2010
REMEMBERING: Lena Horne (1917 - 2010)
Dia 9, preparando uma postagem sobre Magnólias, na qual tertuliei um pouco sobre “Show Boat”, Kathryn Grayson e Ava Gardner, pensei muito em Lena Horne e como "perdeu Julie” para Ava por causa de sua cor de pele – apesar do ironico fato de Julie agradecer seu “afastamento” do “Cotton Blossom” (o Barco das ilusões) ao fato de ter sangue negro correndo em suas veias… Lena tinha criado e composto sua Julie em 1946 para o filme “Till the clouds roll by” (Uma biografia sobre Jerome Kern), e, mais uma vez ela teve que usar os roxos e rosas que a Metro lhe impunha e que a tornavam muito mais uma “Caribeña” do que uma nativa do Harlem…
Pensei tanto nela e até no fato que lhe deveria fazer uma postagem… brevemente… sobre “Stormy Weather” talvez? Seu melhor filme – no qual foi emprestada para a 20th Century Fox e teve realmente um “papel” (explicações depois). Tudo isso no dia 9, dia em que morreria… Coincidencia?
Jamais me contentei em só ouvir Lena Horne. Gostava de ouví-la vendo-a. Alguma qualidade sua, de uma força eletrificante e ao mesmo tempo indescritível, sempre chamou-me a atenção.
Lena, nos anos da MGM, teve uma carreira muitas vezes extremamente injustiçada. A maioria de suas aparições na tela eram simplesmente cenas musicais, nunca papéis principais – estas poderiam ser fácilmente retirada dos filmes no Sul dos Estados Unidos, já que a platéia sulista não estava de acordo com a aparição de artistas da raça negra nas telas dos cinemas e poderia “ofender-se” (O mercado do Sul era muito importante para os estúdios e estes – como o dinheiro sempre manda – estavam dispostos à fazer qualquer concessão… ).
Ela mesmo descreveu como sua maquiagem era esbranquiçada para torná-la um tipo muito mais claro do que era e de como, num filme chamado “Cabin in the sky” (1943, vide foto acima: o primeiro filme dirigido por Vincente Minnelli), uma cena sua numa banheira, na qual cantava “Ain’t it the truth?”, foi cortada porque o estúdio considerou muito “risquée” uma mocinha negra tomando um banho de espuma… O seu nariz nunca foi realmente explicado mas comparando-se fotos é óbvio que passou por uma “remodelagem” como anos depois Diana Ross e Michael Jackson (em muito maior escala) passariam… Aliás, eles a consideravam a "mãe" de todos os artistas negros americanos (ela trabalhou com ambos em "The Wiz").
Lena, como citado acima, perdeu “Julie” para sua amiga Ava Gardner, foi colocada numa lista negra (por causa de suas convicções políticas), não conseguiu empregos, engoliu terríveis humilhações, teve que esconder seu casamento durante anos (misturas raciais não eram “bem-vistas” em Hollywood) e numa questão de seis meses perdeu seu pai, seu marido e seu filho. Uma Lena reclusa voltou à indústria de forma nova. Ela transformou-se numa Lena mais agressiva, mais sofrida, mais real. Madura. Inteira. Esta nova «qualidade», que o destino lhe colocou, deu-lhe sua segunda carreira. Magnífica. Impressionante como ela pode canalizar a dor, torná-la quase palpável para nós.
Lena disse no final de sua vida: "My identity is very clear to me now. I am a black woman. I'm free. I no longer have to be a 'credit'. I don't have to be a symbol to anybody; I don't have to be a first to anybody. I don't have to be an imitation of a white woman that Hollywood sort of helped me become. I'm me, and I'm like nobody else."
Aos 92 anos ela nos deixou e, para repetir o que sempre digo, quando estes grandes mitos nos deixam: sinto-me meio viúvo de novo. Meio triste.
Mais uma das que “restavam” se foi. Difícil as vezes imaginar o mundo sem tantos talentos...
Grande Lena!
Aqui uma das canções (e cenas) preferidas de meu pai : Stormy Weather.
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